segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Aos meus pais...

Hoje fui levar os meus pais ao aeroporto, pois eles vieram cá passar as festas e tiveram de regressar a Portugal. No regresso a casa, tive uma estranha sensação, como se tentáculos se entrelaçassem na minha garganta, e chorei desalmadamente. Quando já me sentia ligeiramente aliviada emocionalmente, tentei compreender o porquê desta minha angústia exprimida através do choro. Um turbilhão surgiu na minha mente.

Primeiramente, os meus pais são das melhores pessoas que conheci em toda a minha vida: são humildes, tremendamente inteligentes e práticos, apreciam as pequenas coisas como se lhes dessemos o Mundo, valorizam a agricultura e os animais (o que me fascina nos dias de hoje mais do que nunca), apreciam a liberdade, e sobretudo, conhecem-me e têm um amor incondicional por mim.

Então, surgiu na minha mente uma outra visão: a do meu trabalho. Cuido de pessoas idosas e em fase terminal há cerca de cinco anos. E amo o que faço. Os idosos que cuido, aos meus olhos, é como se fizessem parte da minha família e a minha felicidade depende da deles. Além de ser enfermeira, assumo diáriamente o papel de neta e enche-os de mimos, psicóloga e tento compreendê-los, cabeleireira e manicure pois eles adoram sentirem-se apaparicados, e graças ao maldito Alzheimer, também assumo o papel de anfitriã tentando acalmá-los em fases de crise e desorientação.

Quando terminei de fazer estas duas análises, apercebi-me então que emocionalmente justapus todas estas visões, e apercebi-me do quanto tenho medo de ver os meus pais envelhecerem e se tornarem nos idosos que cuido todos os dias. E não apenas de envelhecerem, mas também de se sentirem sós ou abandonados como muitos pacientes exprimem todos os dias enquanto lhes faço a higiene e os visto.

Se hoje estou a escrever este texto, é para realizar o que os habitantes do país onde resido chamam de "auto-cura". Assim, lerei e relerei este texto quando a angústia se apoderar de mim novamente, e tranquilizar-me-ei, pois no meu coração sei que o sentimento de abandono ou de solidão nunca será sentido pelos meus pais. O meu amor por eles é imenso, e no que depender de mim, jamais os abandonarei. Cuidarei sempre deles, e nunca deixarei de lhes dizer o quanto os amo e adoro, pois se o valor desta vida existe, é porque o amor existe.

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